Geadas
Discussão sobre os possíveis impactos das geadas da última semana em diferentes culturas agrícolas.
Por Consultoria Agro
A geada desta última semana
A ocorrência de geadas na última semana, especialmente no dia 20/7, que se espalhou desde os estados da região Sul do Brasil, passando por parte do Sudeste e Mato Grosso do Sul, impactou lavouras perenes e culturas de ciclo curto, caso dos produtos hortifrutigranjeiros, por exemplo.
Entre as culturas perenes, os maiores danos ocorreram sobre as lavouras de café arábica, já que o frio intenso atingiu áreas do Paraná, Sul de Minas, Alta e Baixa Mogiana e Cerrado Mineiro, que representam a maior parte da produção nacional.
Os danos não ficaram restritos aos plantios em áreas de baixadas, naturalmente mais sensíveis, e que avançaram na última década a despeito da maior probabilidade de geadas nessas condições. A severidade deste evento tem sido comparada à geada de 1994 que foi significativa. A seguir um detalhamento maior do que é possível dizer até o momento.
Impactos por cultura
Café
•Uma boa mensuração dos danos requer certo tempo para ser feita, uma vez que os impactos variam muito conforme a intensidade da geada, podendo gerar desde uma desfolha da parte superior, com prejuízos menores, já que nestes casos a planta se recupera, até a perda total da lavoura, geralmente as mais novas.
•Além disso, mesmo em áreas em que a geada não ocorreu, portanto sem queima da planta, há efeitos negativos invisíveis na fisiologia da planta, que prejudicarão as próximas floradas e a formação de frutos, o que só será conhecido mais ao final do ano, após o dimensionamento do pegamento da florada.
•O que já possível dizer é que a próxima safra de café (2022/23), de ciclo alto, foi comprometida de maneira não desprezível. Em um primeiro levantamento, a Conab estimou que 21% da área total de arábica sofreu algum grau de dano. Já a Epamig em conjunto com a Embrapa Café traçou cenários com reduções entre 4 e 11 milhões de sacas no próximo ano.
•Vale lembrar que o cenário de recuperação da produção já era desafiador em função da drástica seca deste ano, que prejudicou o desenvolvimento vegetativo das lavouras as colocando em má condição para as floradas, que normalmente vêm a partir do retorno das chuvas em set-out.
•As geadas agravam ainda mais a perspectiva para o próximo ciclo, que já carregava maior responsabilidade para o suprimento de arábica, após um ano de forte quebra de produção. Certamente um novo superávit entre produção e consumo no balanço de oferta e demanda ficou mais difícil e isso ocorre em um momento de melhora na perspectiva do consumo mundial da bebida, na esteira da recuperação econômica em curso diante do alívio da pandemia.
•No caso das lavouras novas atingidas, que iriam produzir em 2022, e aquelas recém formadas (plantios de 2020), a necessidade de replantios implicará em menor potencial também para o ano de 2023 ou além, a depender das novas formações.
•A rápida e substancial alta dos preços elevou sobremaneira as chamadas de margem, o que exige aportes significativos por parte das empresas e mesmo de produtores que possuem operações de fixações diretamente em bolsa.
•Alguns produtores menores e mais atingidos, que já vinham em situação financeira mais apertada poderão não conseguir se recuperar dado o elevado valor necessário na formação de novos plantios e o tempo até o início da produção. Isso também retira potencial futuro de produção com algumas áreas podendo ser destinadas à outras culturas.
Este cenário acaba sendo indiretamente positivo para o café conilon, que não foi impactado pelas
Laranja
•De acordo com o Cepea, as geadas não foram generalizadas nos pomares e ainda não há como afirmar que haverá impacto no volume produzido na próxima safra (2022/23), embora exista preocupação com as lavouras mais novas (em fase de brotação) e aquelas com maior incidência de greening. Porém, para a safra atual, a qualidade das laranjas nos pés deve ser prejudicada, com interior seco e cristalização assim como observado após as geadas no final de junho e início de julho. Vale lembrar que as geadas encontraram os pomares em condição debilitada pela seca.
Cana-de -açúcar
•Os impactos da geada na cana começam a ser visíveis apenas de 10 a 30 dias após a ocorrência. Além de sua intensidade, que consiste na temperatura mínima e no tempo de exposição da planta, o perfil do canavial também determina os níveis dos danos.
•Nesta última geada os maiores impactos deverão ser sentidos em áreas que estavam programadas para serem colhidas em setembro/outubro (cana atualmente com 9-10 meses) e que sofreram com danos mais severos, como a queima da gema apical. Quando isso ocorre, há uma interrupção do crescimento dos colmos, aonde se deposita o açúcar na planta, o que exige uma antecipação da colheita para evitar danos maiores, visto que nesse estágio há uma deterioração da planta e do açúcar contido nela. Nesse caso, além de atrapalhar o planejamento de colheita, a cana colhida antes do seu desenvolvimento pleno implica em redução na produtividade e na qualidade (volume de ATR).
•Por fim, com praticamente um terço da safra 2021/22 já colhida, a cana que tinha acabado de ser cortada e estava em rebrota também sofreu impacto da baixa temperatura, que vai desde a redução de volume e a qualidade (ATR) da matéria prima que será colhida em 2022/23 até a queima da gema apical que necessita de um novo plantio e pode causar atraso no desenvolvimento desta cana para a próxima safra.
Hortifruti
•Na Região Sul, as variedades e os ciclos da cultura permitem melhor resiliência às geadas. Por outro lado, na região Sudeste, os polos de produção de hortaliças já apresentaram os efeitos das perdas nos preços de alguns produtos, caso de alface e batata. Cebola e cenoura, por serem mais resistentes, foram menos impactadas devendo ter atraso na colheita mas não graves perdas. Já os cultivos de batata e tomate em SP e MG foram prejudicados, o que deve abrir espaço para elevações de preço ao longo dos próximos meses até a recuperação da oferta. No caso das frutas, as culturas da banana e manga em MG e SP também tiveram a produção e a qualidade dos frutos comprometidos em função das baixas temperaturas.
Trigo
•Sendo a cultura bastante resistente à geada nos estágios iniciais os impactos foram pouco sentidos na lavoura. Segundo o DERAL (Departamento de Economia Rural do Paraná), até semana a passada o percentual da área paranaense com trigo em desenvolvimento vegetativo somava 72%. Contudo, no Norte do estado, algumas áreas do cereal já em condições avançadas como florescimento e até enchimento podem apresentar perdas pontuais. A preocupação agora gira em torno das temperaturas baixas nos próximos dias, visto que as condições mais susceptíveis a perda de produtividade já concentram 28% da área plantada do estado do PR.
•No Rio Grande do Sul, ainda é pequeno o percentual (<0,5%) de áreas em condições de florescimento segundo o último boletim do EMATER. As geadas nessa condição de lavoura auxiliam no perfilhamento, reduzem as pragas e doenças fúngicas impactando na redução de defensivos químicos na lavoura. Em algumas regiões do estado, o que mais preocupa no momento é a falta de chuvas. As condições da lavoura na Argentina e no Uruguai estão similares às do RS, em boas condições do desenvolvimento vegetativo.
Milho
•Embora a área exposta ao impacto da geada da última semana tenha sido menor que a do início de julho, ainda havia uma parcela relevante da lavoura em fase de floração em enchimento que deverá ser impactada e, assim, reduzir ainda mais os níveis de produtividade esperados. No estado do Paraná, por exemplo, de acordo com o DERAL, na última semana o % de área suscetível à geada era de 41% (4% em floração e 37% em frutificação). O percentual de área mais exposta ao frio intenso caiu para 19% essa semana, mas ainda é relevante e poderá ser impactada pela geada prevista essa semana.
Os riscos continuam nos próximos dias
•Novos episódios de geadas são previstos para atingir o estado de SP e o Sul de MG na quinta e sexta feira desta semana, dias 29 e 30/7, o que representa novos riscos para cultivos de laranja, cana de açúcar, hortaliças e café, que são bastante concentrados nessas regiões.
•Segundo o mapa do INMET, todo o estado de SP terá geadas de intensidade fraca a moderada na sexta feira, condição semelhante ao alerta do dia 20/7 que causou estragos. Essa condição também alcançará o Sul de Minas.
•Por outro lado, a Somar Meteorologia indica que o frio não será tão forte quanto o da semana anterior, embora recomende atenção com as plantas fragilizadas pela geada da semana passada.
•Já na Região Sul, uma ampla área desde o norte do RS até o Centro Sul do PR deve ter geada forte, o que é preocupante para o trigo, além do café no norte paranaense.
•Apesar da intensidade não desprezível do frio, a passagem da frente fria deve ser rápida, com as temperaturas se elevando já no próximo final de semana.