Climate Week Cubo

Crise climática: soluções passam por construção coletiva

Por Itaú BBA

06 minutos de leitura

Quais caminhos e soluções podem ser construídos e adotados para uma transição climática eficiente, e o que esperar da COP 30? Quais desafios e oportunidades o Brasil tem pela frente, além de sediar, em Belém (PA), a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas? Como garantir seu protagonismo e os financiamentos necessários para que a transição aconteça?

Estas foram algumas das perguntas discutidas por acadêmicos, líderes empresariais, especialistas e representantes de organizações internacionais no “COP ao Cubo”, o quarto dia da São Paulo Climate Week, promovida no Cubo, de 26 a 30 de agosto.

O COP ao Cubo, em cinco diferentes painéis, debateu soluções para a crise climática global com foco principal no Brasil nos próximos 15 meses, até a conferência do clima em Belém.

A principal conclusão é que não haverá avanço sem participação coletiva. Governo, iniciativa privada, instituições financeiras, mídia, universidades e sociedade precisam dividir responsabilidades e trabalhar de forma conjunta.

Agro

A agropecuária, um dos setores que no Brasil mais impacta a mudança climática e é impactado por ela, foi tema de um dos painéis. Cerca de 25% do PIB brasileiro vem do setor, e estima-se que a produção brasileira alimenta cerca de 10% da população mundial.

“É urgente pensarmos em práticas menos emissoras”, disse Leandro Gilio, professor e pesquisador do Insper, ao lembrar que por volta de 70% de todas as emissões de gases do efeito estufa do país estão vinculadas às mudanças de uso da terra e à agropecuária.

Espera-se que o Brasil anuncie novos compromissos de sua NDC (Nationally Determined Contribution, ou Contribuição Nacionalmente Determinada) na COP 29, entre 11 e 24 de novembro deste ano, em Baku, capital do Azerbaijão. “Foi uma decisão ousada, uma vez que os países signatários têm até fevereiro de 2025 para isso”, disse Eduardo Bastos, diretor da ABAG (Associação Brasileira do Agronegócio).

Bastos também mencionou que, apesar das expectativas em torno da COP no Brasil, no ano que vem, é preciso voltar primeiro as atenções para a conferência deste ano, considerada a COP das finanças, já que um dos pontos cruciais é como financiar a transição para uma economia de baixo carbono e para a disseminação de práticas sustentáveis, como a agricultura regenerativa e a recuperação de pastagens degradadas.

Para ele, é fundamental aproveitar as contrapartidas que o agronegócio brasileiro tem a oferecer, em operações de financiamento e investimento. “Nas áreas que receberem financiamento, não haverá desmatamentos, ainda que sejam permitidos legalmente. E nelas, além da captura de carbono, serão produzidas comida e energia para o mundo todo. Podemos ajudar a solucionar três grandes crises globais: a climática, a energética e a alimentar.”

Gilio concorda: “O Brasil tem soluções tecnológicas e práticas excelentes, neste setor. O desafio, agora, é construir e apresentar maneiras de elas serem apoiadas, financiadas e disseminadas.”

O preço do carbono

Outro desafio, segundo Natália Renteria, diretora de assuntos regulatórios e comunicação da Biomas, é precificar o carbono. Enquanto uma legislação específica para isso não vem, o mercado voluntário cresce, com a iniciativa privada trabalhando para construir e alavancar soluções e projetos que emitam créditos. “Num país com o perfil do Brasil, com capacidade de geração de créditos verdes com importância e capacidade de produção únicas no mundo, com a qualidade que a gente pode oferecer, abriu-se uma portinha no mercado regulado que permite a entrada destes créditos do mercado voluntário”, explicou.

Um estudo recente da consultoria BCG apontou que, para financiar a transição climática, devem ser necessários US$ 10 trilhões até 2030. “No Brasil, está sendo construída uma taxonomia que vai trazer classificação por setores, para que tenhamos mais clareza do que é economia verde, o que é economia de transição, o que trará mais segurança aos investimentos”, disse Fabio Guido, gerente de sustentabilidade e estratégia ESG do Itaú Unibanco.

Os participantes do painel sobre financiamento climático debateram de onde deve vir o dinheiro para a transição. “Não dá para escolher um só tipo de capital, neste momento”, defendeu Philipe Käfer, analista sênior e Brazil Lab Program Lead da Climate Policy Initiative. “Dinheiro público e dinheiro filantrópico sozinhos não farão a mudança. Daí a importância do blended finance.”

Mesmo mesclando capital, ainda há barreiras para os financiamentos fluírem e terem direcionamentos corretos. Além da percepção de riscos pelos investidores, há questões de câmbio, de dados mal coletados ou da ausência destes, e falta de capacidade técnica.

Mas, apesar dos desafios, há também uma grande oportunidade. “Com a nossa biodiversidade, temos uma chance enorme de mostrar ao mundo, como protagonistas, como fazer a transição para o net zero”, apontou Paula Peirão, coordenadora para América Latina e Caribe do Environment Programme Finance Initiative (UNEP FI), das Nações Unidas.

Transição energética

No painel sobre transição energética, Alexandre Breda, gerente de sustentabilidade e inovação da Shell, reforçou a importância de o país se posicionar como protagonista. "Por isso decidimos focar naquilo em que o Brasil realmente tem uma vantagem competitiva", disse.

Entre os projetos de pesquisa e desenvolvimento da Shell neste sentido, ele citou o de plantar e utilizar o agave, planta típica de regiões semiáridas, para a produção de etanol.

Para Fábio Cirilo, gerente global de sustentabilidade e energia da Votorantim, a descarbonização só acontecerá se houver investimentos em uma energia limpa e barata. "No Brasil, temos acesso a muito resíduo da agroindústria. E a Votorantim tem olhado para este resíduo de biomassa como um bom insumo nesta transição energética", disse.

"O Brasil já é uma grande potência em energia renovável. E usar essa vocação torna o ambiente muito propício para a transição." Globalmente, cerca de 30% de todo o combustível atualmente utilizado pela empresa, segundo Cirilo, é proveniente de resíduos. "E a meta é dobrarmos isso, até 2030."

S de Social

O lado social não ficou de fora dos debates. “A transição energética tem de acontecer de forma justa, garantindo trabalho decente e requalificação”, defendeu Julia Motte-Baumvol, professora da Université Paris Cité.

Para ela, nos países em desenvolvimento “justiça” na transição energética é sinônimo de financiamento justo, transformação tecnológica e respeito aos direitos das comunidades e dos trabalhadores.

O último painel do dia debateu sobre os rumos para a COP 30. Nele foi reforçada a necessidade de cooperação e interdisciplinaridade para uma transição climática. “Se a gente quer deixar um legado, temos de costurar melhor, entre governo, setor privado e sociedade civil, a implementação das soluções discutidas em âmbitos restritos”, disse Gabriella Dorlhiac, diretora executiva do ICC Brasil.

Mais do que isso, para ela é preciso ampliar a discussão sobre transição climática até os municípios. “A iniciativa privada tem conversado com eles? Porque a demanda por financiamentos climáticos deve partir também das cidades”, defendeu. “Muitas vezes, quem mais precisa do capital em financiamento verde tem acesso extremamente restrito a ele.”

O painel ressaltou ainda a importância da inclusão de comunidades locais nas discussões que ocorrem em grandes centros. “No contexto da COP 16 da Biodiversidade, por exemplo, é preciso incluir diretamente as comunidades locais, especialmente as da Amazônia, que, apesar de protagonistas no tema da bioeconomia, são frequentemente excluídas das discussões”, apontou Viviane Romeiro, diretora do Conselho Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).