Good COP, bad COP: Sucessos e fracassos da cúpula de Dubai

Resumimos e explicamos tudo o que importa saber, quais as implicações práticas e o que esperar daqui para a frente.

Por Itaú BBA

09 minutos de leitura

A essa altura talvez você já deve ter lido que a COP28, a conferência do clima realizada em Dubai, terminou no dia 13 de dezembro com uma vitória histórica: pela primeira vez em quase 30 anos desde a criação da cúpula anual pela ONU, houve uma menção à necessidade de o mundo se afastar dos combustíveis fósseis.

Mas por que isso é importante? O que significa na prática e que outras vitórias e fracassos foram selados nas areias do deserto? A seguir, resumimos e explicamos tudo o que importa saber, quais as implicações práticas e o que esperar daqui para a frente.

Enfim, os fósseis

O documento final da COP28, aprovado por quase 200 países, fala em uma “transição que se afaste dos combustíveis fósseis, acelerando a ação nesta década crítica”. O texto afirma que o mundo deve chegar a 2050 livre dos combustíveis fósseis, leia-se carvão, óleo e gás.

Os esperados termos “redução” (phase down) ou “eliminação” (phase out) ficaram de fora. A pressão por uma declaração incisiva tinha apoio de europeus, americanos, brasileiros e dos países mais vulneráveis, mas não foi capaz de vencer a resistência dos países do cartel do petróleo, encabeçados pela Arábia Saudita.

Mas, independentemente da ‘linguagem’, como se diz no jargão diplomático das COPs, a mensagem é clara. Outro marco importante do documento final é que pela primeira vez o texto define que as metas de emissões devem estar alinhadas ao objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5ºC em relação ao período pré-industrial, com reduções específicas até 2035. Até então, falava-se apenas em manter o aquecimento global muito abaixo de 2°C e, idealmente, abaixo de 1,5°C (lembrando que já chegamos à marca de 1,2° e que se nada mudar caminhamos para chegar a 2.8ºC em 2100).

O acordo também traz um pacote de rotas para o setor de energia, como triplicar as fontes renováveis e dobrar a eficiência energética até o fim desta década.

No entanto, estar no texto não garante nada: é apenas o começo de uma era não dependente de combustíveis fósseis.

Serve para apontar uma direção para países, empresas e investidores sobre o consenso do caminho a ser seguido. Mas daí a se implementar tudo o que é necessário para chegar lá são outros quinhentos.

O principal fator é o financiamento da transição (falaremos disso mais adiante).

Embora a decisão tenha sido ovacionada em plenário, claro que também houve críticas, especialmente em relação à falta de um cronograma preciso para redução dos combustíveis fósseis. Mas não só.

Gás e captura de CO2

O documento final pavimentou o caminho para que o gás natural, um combustível fóssil de emissões reduzidas em relação a outros derivados de petróleo e ao carvão, seja considerado um ‘combustível de transição’. O texto não chama o gás pelo nome, mas os bons entendedores entenderam.

Os mais céticos não gostaram, afinal, trata-se de legitimar o uso prolongado de um combustível de origem fóssil.

O fato é que a decisão tem implicações para o Brasil, que tem feito grandes descobertas de gás natural, a um custo baixo de produção. O posicionamento deve respaldar o argumento daqueles que defendem seu uso em escala por aqui, com investimentos em produção e distribuição.

O texto também posicionou a captura e estocagem de gás carbônico ao lado de energias renováveis e nuclear como tecnologias-chave para a transição, dando impulso para um segmento que tem atraído a atenção de investidores.

Perdas e danos

No primeiro dia da conferência foi operacionalizado o chamado fundo de perdas e danos para ressarcir os países pobres que já sofrem prejuízos causados pela mudança do clima. Ele ficará sob a gestão do Banco Mundial.

Trata-se de um grande avanço, por se tratar de fundamental mecanismo para a justiça climática, conceito segundo o qual a transição tem que levar em conta que os impactos das mudanças climáticas atingem de forma mais dramática grupos sociais menos favorecidos.

O estabelecimento do fundo sempre foi uma das grandes quedas de braço entre países ricos e pobres nas COPs. No entanto, por pressão especialmente dos Estados Unidos, ficou definido que as contribuições das nações desenvolvidas serão voluntárias.

Diante de uma estimativa de necessidade de US$ 400 bilhões por ano nos países mais afetados pelas mudanças climáticas, o fundo recebeu o compromisso de doações que não chegaram a US$ 800 milhões na largada.

Mercado de carbono

Um dos principais desafios desta COP foi não ter conseguido chegar a um acordo para a implementação do chamado Artigo 6 do Acordo de Paris, que cria as bases para as trocas internacionais de créditos de carbono de forma a ajudar os países a cumprirem suas metas nacionais. Trata-se de uma espécie de mercado global de carbono. (Para uma explicação didática, consulte a seção ABC do ESG desta edição).

Houve divergências sobre os critérios para garantir a qualidade dos créditos negociados, além de outros aspectos de controle. O famoso “o ótimo é inimigo do bom”.

Show me the money (o foco das próximas COPs)

Agora que a COP28 finalmente conseguiu a proeza de reconhecer a necessidade de se abandonar os combustíveis fósseis, entrará na sala das próximas conferências um outro elefante: o dinheiro.

Afinal, como mudar economias inteiras que dependem da receita do petróleo? Como financiar a conta da transição? E o custo de adaptação aos eventos extremos?

Só para a chamada ‘mitigação’ das mudanças climáticas, ou seja, para fazer a transição da economia para baixo carbono, serão necessários US$ 2,4 trilhões por ano. Outros US$ 215 bilhões a US$ 387 bilhões por ano são estimados para preparar os países mais pobres e vulneráveis para os impactos que serão sentidos, a chamada adaptação.

Estamos falando de uma mudança sistêmica: avançar nas reformas dos bancos de desenvolvimento multilaterais para alavancar investimentos privados, atrair o capital comercial e também aumentar o fluxo de recursos nacionais dos países ricos.