O clima em Davos

Onde CEOs e chefes de estado se encontram

Por Itaú BBA

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Desde os anos 2000, o enfrentamento das várias crises ambientais têm lugar garantido na reunião anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. A edição de 2025 manteve a tradição. Sob o guarda-chuva do tema principal, “Colaboração para a Era Inteligente”, as soluções climáticas e outros temas da agenda ESG estiveram presentes em muitos painéis nas cinco trilhas temáticas (“Protegendo o planeta”, “Reconstruindo a confiança”, “Reimaginando o crescimento”, “Investindo nas pessoas” e “Setores na Era Inteligente”). Este ano, estavam lá cerca de 3 mil pessoas de 125 países, incluindo 900 CEOs, 50 chefes de Estado e líderes variados em campos da tecnologia, da gestão e das políticas públicas.

O encontro, de 20 a 24 de janeiro, deixou evidente quanto de trabalho o mundo tem a fazer – e o papel fundamenta do setor privado na resolução dos problemas à frente.

Oportunidades em série

Dentro do tema inteligência artificial, o economista Nicholas Stern e o consultor Mattia Romani, colegas no Instituto de Pesquisa Grantham, publicaram pelo Fórum um artigo que lista o que esse salto tecnológico pode fazer pelo clima: acelerar inovação; reforçar sistemas de alerta precoce, adaptação e resiliência; simplificar sistemas complexos (por exemplo, dando mais previsibilidade ao fornecimento de energia eólica); e melhorar os modelos climáticos, a eficiência das campanhas educativas e a previsão de comportamentos sociais diante da crise climática e das reações contra ela.

Davos dá muito espaço a vozes diferentes, como a da executiva chinesa Katherine Gao Haichun, de 31 anos, herdeira e co-presidente da Trina Solar, uma das maiores fabricantes de painéis fotovoltaicos no mundo. “Por décadas, tivemos dificuldade para resolver o trilema da energia – o balanço entre segurança, preço e sustentabilidade. Essa era terminou”, disse ela no Fórum, ao informar que o custo médio da energia nos projetos da empresa caiu a 3 centavos de dólar por kWh, um décimo do que era no início do século. “Em alguns dos nossos projetos, em áreas como o Oriente Médio, isso cai para 1 centavo de dólar por kWh – o custo de energia mais baixo da história da humanidade.”

Ao longo do evento, vários participantes indicaram lacunas ou tendências de mercado que merecem atenção nos próximos anos:

-Al Gore, ex-vice-presidente dos EUA, chamou a atenção para alguns desequilíbrios – nos países em desenvolvimento há menos painéis solares, maior custo de capital para projetos de energia limpa e menor participação do capital privado nas finanças climáticas.

-Andrew Forrest, presidente da mineradora Fortescue e investidor em hidrogênio verde (inclusive no Brasil), afirmou que sua empresa desenvolveu equipamentos que recarregam um caminhão elétrico de 240 toneladas em menos de 30 minutos e um automóvel em 23 segundos.

-Celeste Saulo, secretária-geral da Organização Meteorológica Mundial, alertou que precisamos de mais sistemas de alerta precoce (EWS) contra desastres climáticos. Para funcionar, esses sistemas exigem sensores, ferramentas analíticas e comunicação eficiente.

-Dilhan Pillay, diretor executivo da holding de investimento Temasek, de Singapura, enumerou setores promissores: hidrogênio verde, combustível sustentável de aviação, energia nuclear e captura de carbono.

-Faisal Alibrahim, ministro da Economia e Planejamento da Arábia Saudita, celebrou que as atividades não relacionadas ao petróleo representam hoje 52% do PIB de seu país e reforçou a necessidade de avançar para uma economia baseada em “capital humano e produtividade”.

-Gao Haichun, copresidente da Trina Solar, ressaltou que painéis solares e turbinas eólicas não bastam para a transição energética. Precisaremos de redes de eletricidade inteligentes e descentralizadas.

-Larry Fink, CEO da BlackRock, apresentou uma estimativa de que data centers nos EUA vão exigir seis vezes mais energia até 2030 do que demandam hoje. Ele também prevê o encarecimento global de materiais de construção.

-Salil Parekh, CEO global da gigante indiana de TI Infosys, destacou a necessidade de mais dados e capacidade de análise sobre emissões de carbono, uso de água e gestão de resíduos.

-Tharman Shanmugaratnam, presidente de Singapura, acredita que as políticas industriais nacionais ainda precisam incluir e dar escala a ações contra as crises do clima, da água e da biodiversidade.

ESG nos Relatórios de Riscos Globais do WEF

Quando os convidados desembarcaram nas montanhas geladas de Davos, já estava à disposição de todos a Pesquisa Global de Percepção de Risco (GRPS, na sigla em inglês) feita anualmente pelo Fórum. A edição 2025 resultou de entrevistas com 900 especialistas em empresas, governos, academia, organizações internacionais e sociedade civil.

Os participantes mostraram mais preocupação com guerras e desinformação na comparação com edições anteriores, mas a percepção de risco ambiental continua firme. No horizonte de 10 anos, entre 33 riscos listados, nada menos que os quatro primeiros são ambientais: eventos climáticos extremos; perda de biodiversidade e colapso de ecossistemas; mudança crítica nos sistemas planetários; e falta de recursos naturais.

O mundo de olho em Belém

Houve ainda um painel sobre a COP30, que acontecerá em Belém do Pará, em novembro. O governador do Estado, Helder Barbalho, insistiu na necessidade de “fazer a floresta viva valer mais do que a floresta morta” e de o evento em seu estado ser uma “COP da implementação”, que avance para transformar decisões em realidade (fora da trilha ambiental, a economia do Brasil também foi assunto de um painel).

Tem ação também

Além das discussões, foram anunciadas ao longo do Fórum iniciativas importantes:

1) a República Democrática do Congo criou a maior reserva tropical do mundo, o Corredor Verde Kivu-Kinshasa, num ecossistema florestal e pantanoso que retém mais carbono que a Amazônia.

2) A Microsoft fechou uma nova compra de créditos de carbono da brasileira Re.Green. A área de florestas a restaurar de acordo com o projeto, na Amazônia e na Mata Atlântica, passou de 16 mil para 33,5 mil hectares.

3) A investidora em mercados de carbono Silvania, a corretora Mercuria e as ONGs Conservation International e The Nature Conservancy apresentaram o plano “Race to Belém”, que pretende levantar US$ 1,5 bilhão para proteger a Amazônia. Esse capital seria obtido a partir de créditos de carbono gerados com REDD+ Jurisdicional ou JREDD – a Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação florestal obtidas dentro de uma jurisdição política, como um estado.

ESG é a nova forma de fazer negócio

Algumas companhias reagiram publicamente ao efeito da eleição dos EUA. Nos Estados Unidos, reafirmaram suas políticas de DEI empresas como Apple, Costco, E.l.f, Goldman Sachs, JPMorgan Chase e Microsoft. No Brasil, entre as empresas que fizeram o mesmo estão Arcos Dorados[1][OG2] (divergindo do McDonald's nos EUA), Carrefour e Natura.

As outras potências econômicas se pronunciaram no Fórum. “Não importa como o cenário internacional possa se transformar, não vão mudar a determinação e as ações da China por uma resposta proativa à mudança climática”, afirmou Ding Xuexiang, vice-primeiro-ministro chinês. "A Europa manterá o curso e continuará trabalhando com todas as nações que querem proteger a natureza e parar o aquecimento global", afirmou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em entrevista à agência de notícias Associated Press.

Mas quem melhor resumiu a situação talvez tenha sido Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima). Primeiro ele lembrou a todos: “já estivemos aqui”. Os EUA saíram do Acordo de Paris em 2020 mas retornaram em 2021. Depois, Stiell qualificou a transição energética como “imparável” e analisou o cenário: “no mercado competitivo e global em que estamos, qualquer um que der um passo atrás em relação a esse significativo impulso adiante deixa um espaço que outros vão preencher – e do qual vão se beneficiar.”