Road to COP30: o mapa do tesouro
Por Itaú BBA
Enfrentar a crise climática custa caro. Ignorar o problema custaria mais ainda, e não só em dinheiro. Mobilizar o capital necessário para a transição, no entanto, representa um quebra-cabeça planetário. Esse é o campo do financiamento climático.
O termo inclui discussões tão diferentes quanto adequar seguros aos riscos climáticos, reformar sistemas tributários para incentivar a descarbonização, desenvolver mecanismos financeiros para remunerar a redução de emissões, canalizar recursos dos países desenvolvidos para mitigação e adaptação nos países em desenvolvimento.
No centro do campo das finanças climáticas, a COP29, conferência do clima realizada no ano passado em Baku, no Azerbaijão, terminou com uma nova meta importante:
- Destinar no mínimo US$ 300 bilhões por ano para que os países em desenvolvimento possam lidar com a crise até 2035 e atingir esse ritmo (no mínimo) no fluxo de capital até 2035
- Tentar aumentar o volume anual de recursos para US$ 1,3 trilhão.
Não se sabe ainda como chegar a esse total, nem quais formatos cabem nessa conta (vale empréstimo?). Uma das poucas certezas é que o capital precisa fluir de entidades variadas, como governos, bancos de desenvolvimento, fundos multilaterais e empresas.
Resolver a equação é um desafio de estratégia, negócios, diplomacia e contabilidade. E a próxima grande chance que temos de chegar mais perto da resposta vai acontecer no Brasil, em Belém, de 10 a 21 de novembro, durante a COP30.
Este ano, o assunto ganhou espaço na Cúpula do BRICS, no Rio de Janeiro, em 6 e 7 de julho. O grupo reúne 11 países (incluindo Brasil, Rússia, Índia e China) que correspondem a 40% da economia global e colocou na programação uma reunião sobre mudança do clima. O resultado foi uma lista de 30 declarações, recomendações e compromissos que vão de reformas de bancos multilaterais a mobilização de capital privado.
As finanças climáticas ocuparam as cabeças também na Conferência de Bonn, preparatória para a COP30, encerrada em 27 de junho; e na Conferência Internacional sobre Finanças para o Desenvolvimento, em Sevilha, encerrada em 3 de julho.
Em Bonn, o Brasil propôs um plano de financiamento climático a fim de “construir caminhos para a mobilização de US$ 1,3 trilhão”, nas palavras da embaixadora Tatiana Rosito. O projeto envolve algumas propostas mais fáceis de implementar, como criar plataformas para conectar projetos locais a investidores globais, e outras mais complexas, como reestruturar bancos multilaterais, a exemplo de Banco Mundial e FMI.
Em Sevilha, os países reunidos chegaram a uma lista de compromissos, incluindo promover o desenvolvimento de seguros adequados para as mudanças climáticas, a adoção de cláusulas nos empréstimos governamentais para que protejam devedores atingidos por eventos extremos e a inclusão de fatores climáticos nas análises de crédito por parte de bancos governamentais e órgãos multilaterais. Outra iniciativa, com participação de países desenvolvidos como Alemanha, Canadá e França, foi organizar uma plataforma para criação de instrumentos de “blended finance”, capazes de atrair mais capital privado para os esforços de descarbonização, junto com o capital público.
As duas conferências serviram também para responder a uma questão fundamental: mostrar que, mesmo num cenário geopolítico para lá de conturbado, ainda existe disposição internacional para esse debate.
O ritmo das negociações entre países pode parecer lento, principalmente diante da urgência imposta por secas, ondas de calor, tempestades e enchentes fora do padrão histórico. Mas as finanças climáticas são um segmento dinâmico e já ocupam espaço bem claro na contabilidade das empresas e governos.
O investimento global público e privado em transição energética – que representa apenas uma parte da conta – alcançou US$ 2,1 trilhões em 2024, um avanço de 11% em relação ao ano anterior, bem acima do crescimento do PIB global (cerca de 3,1%), segundo relatório da Bloomberg NEF. Em comparação com 2020, esse montante mais do que dobrou, com um salto de 124%.
Em 2024, entre os movimentos que se enquadram na transição energética, o estudo constatou recuo de investimentos em private equity e em construção de infra-estrutura, mas aumento das emissões de títulos públicos e privados específicos e do investimento na cadeia de valor (incluindo a mineração dos metais necessários para a transição e a fabricação de equipamentos como baterias, painéis solares e turbinas eólicas).
Nesse último tópico, o relatório informa que o investimento superou o nível considerado necessário para a transição rumo ao net zero em 2050. O cálculo era que precisávamos, nas minas e fábricas, de US$ 44 bilhões por ano em média de 2021 a 2030. O valor foi atingido antes da metade da década. Chegou a US$ 130 bilhões no ano passado e deve passar a US$ 160 bilhões este ano.
Outra pesquisa da Bloomberg NEF estima em US$ 208 bilhões por ano o investimento em biodiversidade, que inclui ações como reflorestamento, preservação florestal e agricultura regenerativa, todos fatores importantes para mitigar as emissões de carbono. O fluxo de investimentos nessa categoria em 2024 superou em 25% as projeções feitas três anos antes. Um detalhe fundamental é que três quartos do total vem de investimentos com expectativa de retorno, isto é, que não se enquadram como filantropia, demonstrando a oportunidade financeira trazida pela transição.
Como se vê, existem notícias animadoras. Mas a ambição da COP30 é apontar caminhos para acelerar e multiplicar – muito – esse fluxo.
Isso porque o plano para a conferência é avançar em pelo menos três grandes temas:
1) A transição justa, que significa distribuir os benefícios e minimizar os impactos negativos da transição entre os diferentes países e populações. A ONU conta com um Programa de Trabalho a respeito e o Brasil tem sido um grande defensor do conceito no debate internacional;
2) a adaptação ao clima. Considerando que as mudanças climáticas já estão ocorrendo, precisamos fazer grandes ajustes para proteger sistemas variados, incluindo cadeias de suprimentos, cidades e comunidades vulneráveis. O objetivo na COP30 é chegar a uma lista de 100 indicadores para monitorar o avanço rumo à Meta Global de Adaptação. A Conferência também deve abrir a primeira fase de operações do Fundo de Perdas e Danos, que tem a meta de destinar US$ 250 milhões até 2026 a países em desenvolvimento;
3) ações de mitigação em geral, a partir do Balanço Global do Acordo de Paris, concluído em 2023.
Esses tópicos se encaixam num propósito mais amplo, que é fazer da conferência em Belém uma COP de implementação.
Mas passar das palavras à ação, em cada um deles, exige financiamento. Por isso, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, propõe que a implementação se organize em vários eixos, como energia e agricultura, mas com um deles atravessando todos os demais: “catalisadores e aceleradores”. E, nesse caso, o catalisador ou acelerador mais poderoso que existe é o dinheiro.