Separando o que importa do ruído em IA
A Inteligência Artificial (IA) se consolida como uma das mais importantes tecnologias emergentes da atualidade, não apenas por seu impacto sobre produtividade e inovação, mas também por seu potencial de transformar a estrutura econômica global. Em meio a um cenário de intensa produção de conteúdo sobre o tema, este artigo sintetiza os principais pontos que vêm moldando a discussão pública e empresarial sobre o papel da IA nos próximos anos.
Por Itaú BBA
Um novo paradigma de crescimento econômico
Historicamente, o crescimento econômico esteve diretamente vinculado à evolução demográfica. Antes de 1700, o PIB global crescia cerca de 8% por século. Com a Revolução Industrial, esse ritmo saltou para 350% por século, sustentado por aumento da população, queda na mortalidade e maior produção de conhecimento. No entanto, as tecnologias emergentes, especialmente a IA, não dependem de ciclos populacionais para escalar.
Segundo Sam Altman, CEO da OpenAI, os sistemas de IA poderão, já no próximo ano, produzir pensamentos originais, ultrapassando a mera repetição de padrões aprendidos. Estima-se que até 2028, esses sistemas poderão ser capazes de supervisionar suas próprias atualizações — iniciando um ciclo de melhoria autônoma e contínua, sem necessidade de intervenção humana.
Essa capacidade inauguraria um ciclo de descobertas tecnológicas aceleradas, o que tem levado especialistas a sugerir a possibilidade de uma “segunda explosão econômica”. Conforme projeções da Epoch AI, quando a IA assumir 30% das tarefas globais, o crescimento do PIB mundial poderá atingir 20% ao ano — um número sem precedentes na história econômica moderna.
Avanços cognitivos e desempenho técnico
A evidência empírica do avanço da IA é significativa. Em 2025, modelos de linguagem desenvolvidos pela OpenAI e pelo Google DeepMind atingiram nível de medalha de ouro na Olimpíada Internacional de Matemática, um feito que, segundo projeções anteriores, só seria possível daqui a 18 anos.
Paralelamente, a corrida por poder computacional se intensifica. Estima-se que, até 2027, o treinamento de modelos de ponta exigirá 1.000 vezes mais capacidade computacional do que foi utilizado no desenvolvimento do GPT-4, modelo da OpenAI.
A crescente demanda energética
Um dos principais desafios associados ao avanço da IA está relacionado à sua alta demanda por energia. De acordo com estudo da RAND Corporation (2025), uma única rodada de treinamento de um modelo de fronteira poderá consumir até 1 gigawatt (GW) até 2028 — e até 8 GW até 2030, caso a tendência de crescimento exponencial em capacidade computacional se mantenha. Para fins de comparação, isso equivale à geração de oito reatores nucleares operando simultaneamente.
Segundo a Agência Internacional de Energia, entre 2022 e 2026 o consumo elétrico global de data centers dobrará, sendo que a IA será responsável por cerca de 90% desse crescimento. Além disso, a integração de IA em serviços cotidianos já gera impacto: a simples incorporação de respostas generativas no motor de busca do Google multiplicou por dez o número de operações de ponto flutuante por consulta, transformando a busca em um processo ativo de inferência computacional.

Soluções energéticas e avanços em hardware
Apesar do quadro desafiador, há sinais de que a oferta de energia poderá acompanhar a demanda da IA. Desde 2020, a Amazon já garantiu mais de 10 GW em nova capacidade de energia renovável. Na China, há iniciativas de redirecionamento de fontes subutilizadas de energia hidroelétrica e solar para abastecer hubs de computação no interior do país. Nos Estados Unidos, autoridades do estado da Virgínia vêm acelerando a aprovação de pequenos reatores nucleares modulares e melhorias na infraestrutura de rede, voltadas especificamente para data centers em larga escala.
O hardware também evolui rapidamente. Cada nova geração de GPUs tem apresentado ganho médio de 20% em eficiência energética por watt. Além disso, empresas como AWS, Google e Microsoft estão desenvolvendo chips personalizados para maximizar o rendimento em inferência de IA. Esses avanços, combinados com planejamento energético, arbitragem geográfica e investimento contínuo em fontes limpas, sugerem um cenário em que os desafios energéticos poderão ser mitigados.
A experiência brasileira: Itaú e o papel estratégico da IA
No Brasil, a recente entrevista de Pedro Moreira Salles e Roberto Setubal — co-presidentes do conselho do Itaú Unibanco — destacou a centralidade da IA na estratégia de longo prazo da instituição. Ambos classificaram a IA como "a tecnologia de adoção mais rápida da nossa história", e indicaram que seu impacto será "muito maior e chegará muito antes do que imaginávamos há um ano".
O banco estabeleceu três diretrizes estratégicas para a adoção da IA:
- Transição de segmentações amplas para ofertas hiperpersonalizadas, em tempo real, baseadas em modelos nativos de nuvem.
- Aceleração dos ciclos de implementação, reduzindo o tempo entre piloto e operação para dias, em vez de meses.
- Construção interna de competências centrais em IA, mesmo diante de parcerias com fornecedores e fusões e aquisições seletivas — com o objetivo de controlar a própria arquitetura tecnológica.
Pagamentos agênticos: a próxima disrupção financeira?
Um relatório recente da QED aborda a emergência dos pagamentos agênticos, realizados por bots autônomos em nome dos consumidores. Ao introduzir um agente de IA entre comprador e vendedor, o fluxo transacional tradicional — com quatro partes (emissor, adquirente, bandeira e comerciante) — pode se expandir para seis ou até nove partes, dependendo de como o agente gerencia as credenciais de pagamento.
Embora essas transações ainda sejam incipientes, gigantes como Visa, Mastercard, PayPal, Coinbase, Amazon, OpenAI, Google e Perplexity já lançaram SDKs para viabilizar compras automatizadas. Dois desafios principais emergem:
- Garantir que essas transações não aumentem o risco de fraudes ou estornos;
- Oferecer aos usuários ferramentas eficazes para controle de gastos e credenciais entre múltiplos agentes.
Com infraestrutura em construção e os principais players do setor mobilizados, a expectativa é que a adoção cresça rapidamente, à medida que a regulação, a segurança e a confiança evoluam.

A aceleração tecnológica traz consigo dilemas sociais. Embora o salto de produtividade impulsionado pela IA possa aumentar a renda média, ele também pode intensificar desigualdades, reconfigurar divisões políticas e ampliar o poder de vigilância estatal.
Governos terão de lidar com questões complexas relacionadas à tributação, educação e proteção cidadã em um cenário onde a inteligência deixa de ser exclusivamente humana. O momento exige políticas públicas robustas e flexíveis, capazes de acompanhar um ritmo de inovação sem precedentes.
Apesar das incertezas, há otimismo. Dario Amodei, CEO da Anthropic, acredita que a IA poderá auxiliar no tratamento de doenças hoje consideradas intratáveis. Segundo ele, este momento pode ser entendido não como uma ruptura, mas como a continuação de uma trajetória histórica de progresso — desde que a sociedade tenha a coragem de abraçar a disrupção de forma responsável.
Conclusão
A Inteligência Artificial avança em múltiplas frentes — do crescimento econômico à infraestrutura energética, das finanças ao sistema político-social. Os dados demonstram que seu impacto já é mensurável e que sua evolução tende a se acelerar. Ao mesmo tempo, os desafios são proporcionais às oportunidades: alta demanda energética, pressão regulatória, riscos éticos e desigualdades ampliadas. A pergunta central deixa de ser “se” a IA mudará o mundo, para “como” faremos essa transição de forma equitativa, sustentável e segura. As decisões tomadas hoje — por governos, empresas e cidadãos — moldarão não apenas os próximos trimestres, mas possivelmente os próximos séculos da história humana.
Fonte: LatAm Tech Weekly, newsletter.
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