Road to COP 30: Mercado regulado de carbono

Por Itaú BBA

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O mercado regulado de carbono no Brasil está em construção – e vai dar trabalho para todos os envolvidos nos próximos anos. As empresas bem-preparadas podem aproveitar a novidade de jeitos diferentes: vão prestar novos serviços para os setores regulados, vender cotas de emissões (CBEs) e certificados de redução de carbono (CRVEs). Além disso, alguns estudos indicam que as empresas reguladas, de forma geral, conseguem melhor desempenho financeiro. Esse bom resultado apareceu em uma das pesquisas mais abrangentes a respeito, publicada em 2024, na China. O preço do carbono irá facilitar a mensuração dos ganhos do investimento na descarbonização Isso porque, desde dezembro de 2024, está valendo a Lei 15.042, que cria o SBCE (Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões). O cronograma definido pelo Ministério da Fazenda é apertado e já está correndo.

As empresas precisam estar atentas a pontos específicos da discussão, na visão de dois dos responsáveis por colocar o mercado em pé – Cristina Reis, subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável, e José Pedro Neves, coordenador-geral de Finanças Sustentáveis no Ministério da Fazenda. Eles recomendam o seguinte:

  • Ao longo da Fase 1, que pode ir até o início de 2027, as empresas e suas entidades de classe vão ter momentos para se manifestar sobre a regulamentação da lei. O governo deve ainda em 2025 definir a governança do SBCE – e o órgão gestor do mercado começa a decidir quais setores vão ser regulados e os limites para suas emissões. Deve ser criado um comitê consultivo, canal ideal para o setor privado apresentar suas posições. Não vai faltar assunto. Desde discussão dos conceitos da legislação, de “fontes”, “instalações” e “atividades” emissoras; e as regras para monitorar e reportar emissões e remoção até a interoperabilidade entre mercado voluntário e regulado. As escolhas nessa fase vão influenciar os negócios mais à frente.
  • Na Fase 2, um período de 12 meses que deve cair entre 2026 e 2027, vai ficar mais claro como precisa ser o ecossistema de serviços exigidos pelo novo mercado: capacitação de profissionais, elaboração de relatórios de emissões, certificadores e verificadores de créditos de carbono, consultorias especializadas. Nessa fase, as empresas mais atentas já vão poder calcular quanto tempo, energia e dinheiro vão investir para se adaptar ao SBCE.
  • A Fase 3, um período de dois anos que deve cair entre 2028 e 2030, é o momento de setores escolhidos apresentarem ao órgão regulador seus primeiros relatórios de emissões. Empresas que tiverem “fontes”, “instalações” e “atividades” (conceitos ainda a definir) que emitam por ano mais de 10 mil toneladas de GEE (gases de efeito estufa) vão precisar ao menos reportar. Aquelas que emitam mais de 25 mil toneladas de GEE vão precisar compras cotas ou permissões de emissões.Apesar do significativo avanço, ainda há um caminho a percorrer – e ele vai render muito debate. Uma parte relevante dessa discussão deve ocorrer na COP30, de 10 a 21 de novembro, em Belém. Organizações de todos os tamanhos – mesmo aquelas que não vão ser afetadas diretamente – fazem bem em acompanhar como evolui a regulamentação, adequar sua agenda ESG e revisar sua estratégia de negócios, a fim de criar e aproveitar as oportunidades nos mercados de carbono.

Vai aproveitar melhor quem se preparar com antecedência – mas sempre com atenção à evolução dos cenários e regulações, já que ainda haverá muito debate e novas decisões dos órgãos do governo envolvidos nesta construção, como Fazenda e MMA.

Vale lembrar que o nosso mercado vai ser do tipo ETS, sigla em inglês para Sistema de Comercialização de Emissões, também chamado de “cap and trade”. “Cap”, porque a autoridade define um limite máximo para as emissões de certos setores e benchmarks a ser seguidos; “trade”, porque envolve compra de cotas (permissões de emissões) por quem ultrapassa o limite e a venda de cotas por aqueles que fiquem abaixo do limite.

A comercialização de cotas de emissões movimenta mais de U$ 900 bilhões por ano . Esses mercados cobrem 19% das emissões globais atualmente. O mais desenvolvido e consolidado é o da União Europeia, lançado em 2005 e atualmente já em sua quarta fase. Os demais mercados, em sua maioria, estão em fase iniciais, seja ainda em experimentos de reporte, monitoramento das emissões ou testes de dinâmicas de preços. No entanto, as tendências indicadas por mercados como o da União Europeia, da Califórnia e da China apontam para limites de emissões cada vez mais baixos, cotas de emissões cada vez mais caras e escopo cada vez maior – a regulação normalmente começa por setores como energia e indústria pesada, e evolui para outros, como transportes e gestão de resíduos.

No cenário nacional, segundo o governo cerca de 5 mil empresas devem ficar sob regulação direta no Brasil, seja para reportar suas emissões ou diretamente participar na compra e venda de cotas de emissões, porém os efeitos do SBCE vão além destas companhias. As companhias dos setores regulados deverão contratar consultorias de descarbonização para ajudarem a revisar processos, desenvolver novas tecnologias e estratégias para evitar o custo da compra das cotas, caso essa via seja a mais custo-efetiva.[1] A demanda por esses serviços deve crescer mais ainda se as exigências avançarem pela cadeia de valor das empresas reguladas (o ETS de Quebec, no Canadá, cobre também as emissões de fornecedores das grandes empresas reguladas em setores como construção civil e transportes).

Como se vê, temos muitas decisões pela frente. O cronograma do Ministério da Fazenda é ambicioso, mas o Brasil precisa manter o ritmo – ou corre o risco de ficar para trás no cenário global. O Banco Mundial conta atualmente mercados no modelo ETS em 36 jurisdições, em diferentes estágios de implementação. Isso inclui a União Europeia, mercados nacionais, como China, Colômbia, Indonésia e México, e subnacionais, como a Província canadense de Quebec, o estado estadunidense da Califórnia e a cidade chinesa de Xangai.

Ficar com um olho aqui e o outro lá fora é importante para aprendermos com os exemplos de outros países, e porque pode haver integração futura de mercados com o modelo ETS. Essa é a experiência da União Europeia com a Suíça e da Califórnia com Quebec

“Um dos temas mais caros para nós, na COP30 e nos debates internacionais, é a interoperabilidade e até mesmo a integração de mercados de carbono”, afirma Cristina Reis, do Ministério da Fazenda.

Para o Brasil, quanto mais rápido a UNFCCC (Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima) avançar na implementação do Artigo 6 do Acordo de Paris, melhor. O artigo trata da cooperação internacional como forma de ajudar cada país a perseguir suas metas de redução de emissões. “Precisamos criar uma coerência entre o nosso mercado regulado, o nosso mercado voluntário e o Artigo 6, três grandes campos. E precisamos ter clareza sobre como nos conectamos ao mercado internacional, seja pelo mercado regulado, seja pelo voluntário”, diz Reis.

Apesar do significativo avanço, ainda há um caminho a percorrer – e ele vai render muito debate. Uma parte relevante dessa discussão deve ocorrer na COP30, de 10 a 21 de novembro, em Belém. Organizações de todos os tamanhos – mesmo aquelas que não vão ser afetadas diretamente – fazem bem em acompanhar como evolui a regulamentação, adequar sua agenda ESG e revisar sua estratégia de negócios, a fim de criar e aproveitar as oportunidades nos mercados de carbono.